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Anisa Shaheed: a corajosa jornalista afegã

03-11-2022 12:14

Jamaija Rhoades

Editora-adjunta da IJNet

03-11-2022 12:14

Jamaija Rhoades

Editora-adjunta da IJNet

Permissão para frequentar a escola ou exercer a maior parte das profissões. Elas tinham acesso restrito aos serviços de saúde e não podiam estar em lugares públicos sem a companhia de um homem, dentre outras limitações de liberdade.

Criada no Vale do Panjshir, no nordeste do Afeganistão, Anisa Shaheed testemunhou a repressão do Talibã contra as mulheres diretamente. “Quando eu era menina, era muito difícil estudar e trabalhar em um país em guerra”, diz.

Shaheed dedicou sua carreira ao jornalismo em meio a essa opressão, com um propósito renovado desde que o grupo extremista retomou o país em 2021. “As pessoas no afeganistão, principalmente as mulheres, vivem sob a sombra do Talibã — um grupo que viola os direitos das pessoas”, diz Shaheed, que morava em Cabul antes de deixar o país no ano passado.

Em reconhecimento ao jornalismo oportuno e incisivo que ela exerceu durante sua carreira, Shaheed é uma das vencedoras do Prêmio ICFJ Knight de Jornalismo deste ano. “Eu queria estar onde quer que houvesse um problema, e levar aquela voz e as notícias para as pessoas”, disse a jornalista sobre seu trabalho. “Essa era a minha vontade, e eu consegui”.

O início de carreira

Depois da perda do poder do Talibã após a invasão dos Estados Unidos ao Afeganistão em 2001, Shaheed pôde cursar jornalismo na Universidade de Cabul. Seu primeiro trabalho foi como repórter de rua no jornal Cheragh Daily, antes de se transferir para o canal de TV independente TOLOnews em 2009.

Desde então, Shaheed se estabeleceu como uma das jornalistas de TV mais notáveis do Afeganistão, ao lançar luz sobre os desafios enfrentados pelas mulheres no país, expondo injustiças e responsabilizando os poderosos.

Em 2016, Shaheed entrevistou um alto funcionário do governo afegão, Ahmad Ishchi, após ele alegar ter sido sequestrado e abusado sexualmente sob ordens do vice-presidente do país, General Abdul Rashid Dostum. As alegações geraram indignação pública e Dostum foi acusado e se exilou.

Ameaças à segurança

Shaheed ajudou a redefinir o que significa ser uma jornalista no Afeganistão diante do risco significativo à sua segurança e bem-estar. “[As pessoas] falam pra mim ‘como você ainda vai trabalhar? Você vai sair outra vez?'”, disse ela em uma entrevista ao PBS NewsHour.

“Quando você está na rua, você não sabe, mesmo se estiver parada, de qual direção alguém pode vir e te matar.”

Na mesma entrevista, ela contou que o Talibã matou sete colegas seus em um ataque a bomba anos atrás. “Eu trabalhei no Afeganistão por mais de uma década, em um país em guerra. Nos últimos anos, o Afeganistão foi declarado o país mais sanguinolento para jornalistas”, explicou Shaheed. “É difícil trabalhar em um país em guerra. Principalmente para as mulheres, [os] problemas de segurança, problemas sociais e familiares dificultam muito para mulheres jornalistas.”

O comprometimento de Shaheed com seu trabalho foi o mesmo quando a COVID-19 varreu o mundo no início de 2020. Ela se arriscou em hospitais para saber mais sobre a doença e compartilhar informações de saúde com o público, enquanto as pessoas faziam quarentena em casa.

Sua cobertura ajudou os afegãos a entenderem melhor as ameaças impostas pelo novo coronavírus ao mesmo tempo em que cobrou do governo como ele estava gastando recursos de ajuda humanitária.

“Quando fui ao hospital para fazer a cobertura, passei horas falando com pacientes, familiares dos pacientes e médicos. Ouvi as histórias de todos; e ao fazer isso eu queria fazer com que as pessoas entendessem que elas não deveriam [entrar em pânico por causa da COVID-19]”, diz.

A reconquista do Afeganistão pelo Talibã

As condições de jornalistas e mulheres no Afeganistão se deterioraram significativamente desde que o Talibã retomou o controle do país em 2021, após a retirada militar dos Estados Unidos. Shaheed buscou refúgio nos Estados Unidos, preocupada com sua segurança.

Mais de 11.000 quilômetros longe hoje, ela continua a cobrir seu país de origem como repórter freelancer. Seu comprometimento em criar uma trilha para outras mulheres afegãs, principalmente as jornalistas, nunca esmoreceu. “Eu queria dizer às pessoas que as mulheres podem fazer qualquer coisa no Afeganistão. As mulheres podem fazer qualquer coisa, elas podem ser jornalistas”, diz Shaheed. “Embora muitos acreditassem que mulheres não podiam trabalhar como os homens no Afeganistão, as mulheres trabalham.”

Agora lutando do exterior por um melhor tratamento dos cidadãos afegãos, Shaheed espera que as circunstâncias mudem em breve para melhor.

“Eu desejo que um dia as filhas do Afeganistão tenham direito à educação, que mulheres [vão] ter o direito de trabalhar, ter o direitos de viver e [que] as pessoas no Afeganistão [vão poder] caminhar em paz nas ruas do país”, diz Shaheed.

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