A análise dos dados oficiais da Comissão do Mercado de Capitais (CMC) de Abril de 2025 revela uma indústria de organismos de investimento colectivo em Angola caracterizada por concentração extrema e aspectos preocupantes. Um dos aspectos é a baixíssima participação de investidores – apenas 5.143 participantes em toda a indústria – sugerindo um mercado elitista e diferente na sua missão de democratização do acesso aos investimentos.
Os dados da CMC ilustram um número extremamente baixo de participantes na indústria de fundos de investimento. Com apenas 4.777 participantes nos Fundos de Investimento Mobiliário e 366 nos Fundos de Investimento Imobiliário, o total de investidores em toda a indústria não ultrapassa os 5.143 participantes.
Para colocar estes números em perspectiva, Angola tem uma população de mais de 34 milhões de habitantes. Isto significa que menos de 0,02% da população participa no mercado de fundos de investimento – uma taxa de participação que é não apenas baixa mas inadequada para a dimesão do país que aspira a ter um mercado de capitais desenvolvido.
Esta baixa participação não é apenas um problema estatístico – é um sintoma que sugere um mercado simplesmente desconhecido para a vasta maioria dos angolanos. Representa uma falha fundamental na democratização do acesso aos investimentos e na função social dos mercados de capitais.
A análise da distribuição de participantes entre as diferentes gestoras revela uma segmentação extrema que sugere a existência de mercados paralelos que servem diferentes classes de investidores. Esta segmentação é particularmente evidente quando comparamos o número de participantes com os activos sob gestão.
A BFA Gestão de Activos serve 4.115 participantes – mais de 80% de todos os investidores na indústria – mas gere apenas 7,36% dos activos totais. Isto sugere que esta gestora serve principalmente pequenos investidores com montantes individuais relativamente baixos. Em contraste, a Independent Finance Advisors gere 36,41% dos activos com apenas 31 participantes, indicando que serve um número muito pequeno de investidores de grande dimensão.
Esta segmentação cria um sistema de duas velocidades onde a maioria dos investidores tem acesso apenas a uma fracção dos recursos e oportunidades disponíveis no mercado.
Os pequenos investidores são efectivamente excluídos das gestoras que controlam a maior parte dos activos, limitando as suas opções e potencialmente prejudicando os seus retornos.
Adicionalmente, a baixa participação no mercado pode sugerir também a existência de múltiplas barreiras que impedem o acesso dos investidores. Estas barreiras podem incluir montantes mínimos de investimento elevados, falta de educação financeira, produtos inadequados para pequenos investidores, comissões excessivas, ou simplesmente falta de conhecimento sobre a existência destes produtos.
A concentração de mais de 80% dos participantes numa única gestora (BFA) sugere que esta pode ser a única que oferece produtos acessíveis a pequenos investidores ou que venda as unidades de participação a preços mais fraccionados. Se isto for verdade, significa que o mercado falha em proporcionar concorrência efectiva no segmento de retalho, limitando as opções dos pequenos investidores e potencialmente resultando em produtos e serviços de qualidade inferior.
Inclino-me fundamentalmente na falta de educação financeira da população angolana. Contudo, esta situação é agravada pela inadequação dos produtos oferecidos e pela minúscula comunicação e divulgação das gestoras. É difícil promover educação financeira quando os produtos disponíveis são complexos, caros ou inadequados para a maioria dos investidores.
A responsabilidade pela educação financeira não recai apenas sobre o sistema educativo ou os reguladores mas também sobre as próprias gestoras, que deveriam investir em programas de educação e comunicação para atrair e educar novos investidores. A aparente ausência destes esforços sugere que as gestoras estão satisfeitas em servir um mercado restrito de investidores sofisticados, ignorando o potencial de crescimento no segmento de retalho.
Particularmente preocupante é o facto de os Fundos de Investimento Imobiliário, que representam 83% dos activos da indústria, terem apenas 366 participantes. Isto sugere que estes fundos são acessíveis apenas a um número muito restrito de investidores de grande dimensão, excluindo efectivamente a maioria dos angolanos do maior segmento do mercado de fundos.
Esta exclusão é problemática por várias razões. Primeiro, priva a maioria dos investidores do acesso a uma classe de activos que, pelos números apresentados, parece ser considerada atractiva pelas gestoras e pelos grandes investidores. Segundo, concentra os riscos e benefícios do sector imobiliário num grupo muito restrito de investidores, limitando a diversificação social dos investimentos.
Terceiro, perpetua desigualdades de acesso ao investimento, onde os ricos têm acesso aos produtos que controlam a maior parte dos recursos, enquanto os menos abastados são relegados a produtos com recursos limitados. Esta estrutura é incompatível com os objectivos de democratização do acesso aos investimentos que deveriam orientar o desenvolvimento do mercado de capitais.
A baixa participação tem consequências que vão além dos prejuízos individuais dos investidores excluídos. Um mercado de capitais com participação limitada é um mercado subdesenvolvido que falha em cumprir suas funções económicas e sociais fundamentais.
Primeiro, limita a capacidade do mercado de capitais de mobilizar poupanças para financiar o desenvolvimento económico. Quando apenas uma fracção minúscula da população participa no mercado, a capacidade de mobilização de recursos é severamente limitada.
Segundo, reduz a liquidez e eficiência do mercado. Mercados com poucos participantes tendem a ser menos líquidos e menos eficientes na descoberta de preços, prejudicando todos os investidores.
Terceiro, limita a pressão competitiva sobre as gestoras. Quando o mercado é restrito a poucos investidores sofisticados, as gestoras têm menos incentivos para inovar, reduzir custos ou melhorar serviços para atrair novos clientes.
A situação actual exige esforços urgentes para democratizar o acesso aos fundos de investimento. Isto inclui a criação de produtos adequados para pequenos investidores, redução de barreiras de entrada, o investimento em educação financeira e a promoção de uma cultura de investimento na população.
Sem estes esforços, o mercado de fundos continuará a ser um privilégio de poucos, falhando em cumprir sua função de democratizar o acesso aos investimentos e contribuir para o desenvolvimento económico e social de Angola. A baixa participação actual não é apenas um problema estatístico – é um sintoma de um sistema que falha em servir adequadamente a população angolana.