Opinião

‎ Protecção de dados: empresas sujeitas a elevadas multas

Salomão Abílio

Jurista

21 Julho, 2025 - 22:49

21 Julho, 2025 - 22:49

Salomão Abílio

Jurista

A protecção de dados pessoais é uma temática de fundamental importância nos ordenamentos jurídicos modernos, merecendo dignidade constitucional. Em Angola, a Constituição prevê, no seu artigo 32.º, que garante a inviolabilidade da vida privada, sendo dever do Estado assegurar a sua efectivação (art. 56.º). Para o efeito, a actual Lei n.º 22/11, de 17 de Junho, Lei de Protecção de Dados Pessoais (doravante “LPDP”) prevê um conjunto de disposições impositivas, com o objectivo de garantir o respeito pelas liberdades públicas e os direitos e garantias fundamentais dos cidadãos, cujo incumprimento determina a responsabilidade civil, administrativa e, até mesmo, penal.

‎A propósito das sanções aplicáveis, um aspecto que suscita reflexão prende-se com as multas fixadas, as quais se entendem excessivamente elevadas, susceptíveis de sufocar as empresas que violem disposições relacionadas com a protecção de dados. Neste sentido, “multas” decorrentes de “contravenções” na lei vigente variam de USD 65 000,00 a USD 150 000,00 (artigo 51.º). O carácter excessivo das punições torna imperioso rever tais limites sancionatórios, com vista à promoção de um regime mais equilibrado que salvaguarde simultaneamente os direitos fundamentais dos titulares dos dados e a viabilidade das entidades sujeitas ao cumprimento da lei.

‎Neste sentido, o Projecto de Revisão da LPDP, submetido à consulta pública entre 17 de Março e 17 de Abril do corrente ano, já contempla uma redução moderada dos montantes aplicáveis às infracções.

‎Essa iniciativa demonstra um esforço em harmonizar a necessidade de prevenção e repressão de condutas lesivas com a criação de condições para um ambiente regulatório mais favorável à actividade empresarial, especialmente no contexto das PME, que representam uma fatia significativa do tecido económico nacional. O actual Projecto de Revisão da LPDP estabelece os seguintes montantes para as infracções:

‎Cinco milhões de Kwanzas (5.000.000, 00) para as violações feitas pelas pessoas singulares.

‎Cento e cinquenta milhões de Kwanzas (150. 000. 000) para sancionar as pessoas colectivas.

‎No contexto actual, a revisão da actual LPDP é mais do que necessária e esperamos que, futuramente, a fixação de elevadas multas possa ser alterada, sob pena de se constituir um grande fardo para as empresas nacionais. Além disso, muitas empresas ainda têm sérias dificuldades em se adaptar à legislação de protecção de dados vigente.

‎A prática internacional, se olharmos para os mais variados ordenamentos jurídicos, tais como das Ilhas Maurícias, do Gana, do Brasil, de França, de Espanha e de Portugal, tem seguido caminho diferente. Em tais jurisdições, vigora a consagração de directrizes e critérios que asseguram a proporcionalidade sancionatória, nomeadamente:

  • ‎A condição económico-financeira do infractor, tratando-se de pessoa singular, ou, no caso de pessoas colectivas, a aferição com base no volume de negócios e no balanço anual.
  • ‎O carácter reiterado ou continuado da conduta infractora, considerando a sua gravidade e duração.
  • ‎A dimensão e natureza da entidade visada, incluindo o número de trabalhadores e os sectores de actividade, de forma a assegurar que a sanção reflita a realidade operacional do agente infractor.

‎A realidade internacional demonstra que a proporcionalidade, enquanto princípio estruturante do direito sancionatório, impõe que a gravidade da infracção, a intencionalidade da conduta, a capacidade económica do infractor e a dimensão da empresa sejam devidamente ponderadas aquando da aplicação das multas.

‎A propósito das PME, importa ainda destacar que diversas jurisdições estabelecem mecanismos de advertência prévia, sobretudo quando não existe dolo ou má-fé. Nessas situações, é comum prever-se a concessão de um prazo razoável para que o infractor corrija a omissão ou cesse a infracção. Tal mecanismo busca não apenas prevenir sanções desnecessárias, mas também fomentar uma cultura de conformidade voluntária e pedagógica, reduzindo os efeitos punitivos desproporcionais sobre entidades com menor capacidade institucional.

‎O tratamento adequado de dados pessoais tornou-se um vector estratégico, não só para a protecção da privacidade individual mas também como motor da eficiência administrativa e da inovação económica. Assim, na futura LPDP, impõe-se ao legislador angolano a adopção de critérios normativos inspirados nas boas práticas internacionais, garantindo um equilíbrio entre exigência regulatória, racionalidade sancionatória e promoção do desenvolvimento económico inclusivo.

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