O Banco Nacional de Angola (BNA) aplicou, recentemente, uma sanção pecuniária no valor de Kz 1.000.000.000,00 (mil milhões de kwanzas) a uma entidade que actua no sector bancário, por infracções consideradas «especialmente graves», em decorrência do incumprimento das obrigações legais de avaliação de risco, identificação e diligência, bem como da obrigação de comunicação, relativamente a operações realizadas no ano de 2022, em violação dos artigos 9.º, 14.º, 17.º e 28.º da Lei n.º 05/20, que estabelece o regime de Prevenção e Combate ao Branqueamento de Capitais, Financiamento do Terrorismo e Proliferação de Armas de Destruição em Massa.
A sanção pecuniária aplicada, correspondente a, aproximadamente, 2,63% do lucro semestral que a entidade visada teve este ano, avaliado em USD 38,4 milhões, revela-se significativa [cálculo efectuado com base na divisão do valor do investimento pelo lucro, multiplicado por 100, tendo como referência a taxa de câmbio oficial do BNA, fixada em 991,955 Kz/USD no dia 8 de Setembro de 2025].
Diante da gravidade da infracção e do impacto reputacional e financeiro que recai sobre a instituição, torna-se urgente reflectir sobre a responsabilização civil dos administradores de sociedades comerciais em Angola [“administradores” em sentido genérico, englobando gerentes e directores], especialmente daqueles que exercem funções ligadas à conformidade, gestão de risco e controlo interno.
Essa abordagem é fundamental para o fortalecimento de uma cultura empresarial baseada na integridade, na prestação de contas e na boa governação, em linha com os padrões adoptados em jurisdições onde as best practices [princípios de corporate governance] são efectivamente aplicados e fiscalizados.
É assim que, em vários países que integram a União Europeia, conforme dados da OCDE constantes no documento “Duties and Responsibilities of Boards in Company Groups, Corporate Governance” (2020), os administradores podem ser responsabilizados civilmente sempre que violem obrigações legais ou princípios fundamentais de corporate governance: (“When they disregard transparency and disclosure rules, shareholder rights and corporate governance standards can likewise lead to directors being held liable”). (Quando desrespeitam as regras de transparência e divulgação, os direitos dos acionistas e os padrões de governança corporativa, os administradores podem, de igual modo, ser responsabilizados.”).
Por outro lado, nos países de tradição jurídica anglo-saxónica, embora seja consagrado o princípio business judgment rule, segundo o qual a responsabilidade civil do administrador pode ser excluída se este demonstrar que agiu de forma informada, livre de qualquer interesse pessoal e com base em critérios de racionalidade empresarial, a responsabilização pessoal de administradores tem sido uma prática recorrente. Os chamados duties of care (deveres de cuidado) constituem um dos pilares fundamentais da responsabilidade dos administradores nessas jurisdições, funcionando como salvaguarda da diligência, da integridade e da prestação de contas na tomada de decisões empresariais.
De tudo quanto ficou dito resulta que, embora a Lei das Sociedades Comerciais angolana estabeleça, no artigo 69.º, que os administradores devem agir no interesse da sociedade, com a diligência de um gestor criterioso e responsável, torna-se imperioso que se avance para uma sindicância judicial do mérito das decisões de gestão, especialmente quando resultam de decisões negociais tomadas de má-fé, com negligência, em benefício de interesses alheios aos da sociedade ou em violação das regras de corporate governance.
Essa evolução é essencial para garantir uma verdadeira responsabilização dos administradores, à semelhança do que já ocorre em jurisdições mais desenvolvidas, como a Alemanha. O artigo 93.º, n.º 1, da Aktiengesetz (Lei das Sociedades por Acções – AktG), na sua redacção actualizada, consagra expressamente o dever de diligência dos administradores, permitindo uma avaliação concreta da razoabilidade das decisões tomadas, com base em critérios objectivos e boas práticas de gestão empresarial.
Portanto, ainda que se respeite o princípio business judgment rule, art. 77.º/1, da Lei das Sociedades Comerciais, que protege os administradores quando actuam de forma informada, desinteressada e racional, é fundamental que se assegure a aplicação consistente dos princípios de corporate governance, com especial ênfase na transparência, integridade e accountability.