Opinião

Contratação Simplificada: instrumento necessário ou desvio ao princípio da concorrência?

Soraya Gomes

Mestre em Direito Empresarial

5 Maio, 2025 - 10:05

5 Maio, 2025 - 10:05

Soraya Gomes

Mestre em Direito Empresarial

A contratação simplificada, prevista no artigo 141.º e seguintes da Lei n.º 41/21, de 23 de Dezembro – Lei dos Contratos Públicos, foi criada para conferir maior celeridade e flexibilidade aos procedimentos de contratação pública, permitindo à entidade contratante celebrar contratos sem recorrer aos trâmites formais e concorrenciais, em situações excepcionais e fundamentadas. O objectivo é garantir uma resposta rápida e eficaz em momentos críticos, como desastres naturais ou urgências hospitalares.

No entanto, à medida que esse mecanismo tem sido utilizado com crescente frequência, surgem questionamentos sobre a sua aplicabilidade e sobre os riscos de desvirtuar os princípios da concorrência, transparência e igualdade no processo de contratação pública. A utilização da contratação simplificada fora de seu escopo natural pode enfraquecer a concorrência e limitar injustamente o acesso ao mercado.

A Constituição da República de Angola consagra, no artigo 198.º, a exigência de respeito aos princípios da legalidade, da igualdade e da concorrência nas contratações públicas. Assim, o uso excessivo da contratação simplificada pode configurar uma violação desses princípios fundamentais, comprometendo a justiça no processo licitatório.

Além disso, a falta de publicidade e o procedimento simplificado tornam os contratos celebrados mais difíceis de fiscalizar, o que pode levar a uma maior opacidade e menor controlo sobre o uso dos recursos públicos. Essa fragilidade no sistema de fiscalização pode aumentar o risco de práticas ilegais, como corrupção e favorecimento indevido de fornecedores.

A adopção indiscriminada da contratação simplificada pode, portanto, prejudicar a transparência e a equidade no mercado público, favorecendo fornecedores em detrimento de outros concorrentes. Isso levanta sérias preocupações sobre a integridade do processo de contratação e o impacto da falta de concorrência nos custos e na qualidade dos serviços prestados.

É importante reconhecer que a contratação simplificada continua a ser um mecanismo legítimo quando utilizada em circunstâncias excepcionais, desde que respeitados os critérios definidos na lei. No entanto, é necessário um maior rigor na sua aplicação, para que não se torne um atalho administrativo, comprometendo os princípios da boa gestão pública. Uma possível solução seria o fortalecimento dos mecanismos de controlo, com a exigência de ampla divulgação posterior das adjudicações e a realização de auditorias periódicas para monitorar a aplicação da contratação simplificada. Isso garantiria maior transparência e um melhor acompanhamento das contratações realizadas nesse regime.

Em suma, a contratação simplificada deve ser vista como um mecanismo excepcional e não como uma prática rotineira. Para garantir que ela cumpra sua finalidade original, é essencial que gestores e fiscalizadores promovam uma reflexão sobre o seu uso, assegurando que o interesse público prevaleça e que os princípios da concorrência e da transparência sejam sempre respeitados.

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