Opinião

Fortalecer fornecedores locais: o verdadeiro caminho da competitividade ‎

‎Josemar Afonso

Consultor de Estratégia

22 Setembro, 2025 - 19:00

22 Setembro, 2025 - 19:00

‎Josemar Afonso

Consultor de Estratégia

‎‎Em Angola, fala-se, todos os dias, de diversificação económica, industrialização e competitividade. Mas, por detrás do discurso, esconde-se um desafio estrutural: as grandes empresas continuam dependentes de fornecedores frágeis e de importações caras. A base local de fornecimento, composta, sobretudo, por micro, pequenas e médias empresas (MPME), não tem ainda capacidade para responder de forma consistente em escala, qualidade e prazos.

‎O resultado é conhecido: cadeias de valor instáveis, custos elevados, baixa previsibilidade e uma economia que continua a exportar divisas em vez de reter valor no país.

‎A solução é clara: formar e capacitar fornecedores locais. Ao aumentar o Willingness to Sell (WTS), a capacidade e a disponibilidade de vender com qualidade e eficiência, não apenas se reforça a competitividade das grandes empresas, como também se cria um ecossistema económico mais resiliente, inclusivo e sustentável.

‎A resposta mais comum em Angola tem sido a integração vertical (internalizar processos que os fornecedores não garantem) ou a horizontal (expandindo para sectores paralelos). Estas soluções resolvem o curto prazo, mas não criam desenvolvimento. Concentrar valor dentro de poucos grupos não fortalece o tecido empresarial nacional.

‎O país precisa do oposto: capilaridade. Cadeias de valor abertas, ramificadas, com fornecedores locais qualificados. Só assim se multiplica o valor na economia e se constrói competitividade duradoura.

‎Para as grandes empresas, MPME locais mais fortes significam ganhos de eficiência, com menos custos de importação, menor risco logístico e maior previsibilidade. Além disso, reforçam a reputação junto de clientes, investidores e reguladores.

‎Para as MPME locais, o impacto é transformador: contratos estáveis, formalização, aumento de produtividade e capacidade para competir em mercados mais exigentes.

‎Para a economia, o efeito é multiplicador: mais emprego, maior retenção de divisas, criação de clusters nacionais e redução da dependência externa.

‎A evidência internacional demonstra que investir em capacitação de fornecedores não é custo, é investimento estratégico. A Accenture estima que cada dólar aplicado em formação gera 4,53 dólares de retorno. A ATD aponta para 2,91 dólares.

‎Nos programas específicos de desenvolvimento de fornecedores, os resultados são ainda mais claros: a Toyota reduziu em 50% os defeitos e aumentou em 20% a eficiência; a Honda obteve ganhos de 15 a 20% em produtividade, elevando as entregas no prazo acima de 95%; a Nestlé reporta retornos de 3 a 5 vezes o valor investido; e a Unilever, ao treinar pequenos agricultores em África, aumentou a produtividade em 20 a 30%.

‎O Banco Mundial confirma: em mercados emergentes, cada dólar investido em capacitação de fornecedores locais gera entre 2 e 5 dólares de retorno directo. Traduzido para Angola, um investimento de 100 mil dólares em MPME locais pode gerar entre 300 a 500 mil dólares em ganhos reais de eficiência, qualidade e previsibilidade.

‎O desenvolvimento de fornecedores locais exige mecanismos claros e consistentes:

  • ‎Partilha de padrões de qualidade para alinhar MPME com exigências internacionais.
  • Formação estruturada, técnica e de gestão, adaptada ao contexto angolano.
  • Incentivos à performance, com bónus e acesso a contratos maiores.
  • ‎Requisitos mínimos de capacitação de gestores e colaboradores.
  • Avaliação e feedback contínuos, para corrigir falhas em tempo útil.

‎Para garantir consistência, as empresas devem organizar-se internamente e seguir um percurso disciplinado:

  • ‎Diagnóstico inicial: mapear e segmentar fornecedores locais;
  • ‎Definição de padrões: clarificar requisitos e KPIs;
  • ‎Formação estruturada: programas técnicos e de gestão;
  • ‎Incentivos à melhoria: bónus de performance e rankings;
  • ‎Estrutura interna dedicada: equipa de Supplier Development ligada a Procurement e Qualidade;
  • ‎Monitoria e expansão: auditorias, scorecards e alargamento progressivo.

‎As grandes empresas só serão verdadeiramente grandes se fizerem crescer as pequenas que as sustentam.

‎O futuro da competitividade em Angola não depende apenas de megaprojectos ou investimento estrangeiro. Depende de transformar as MPME locais em fornecedores fortes, fiáveis e integrados em cadeias de valor modernas.

‎Sem isso, continuaremos a ter grandes empresas com pés de barro.

Partilhar nas Redes Sociais

+ LIdas

Leia também

error: Conteúdo protegido!!

Informação de qualidade que o ajuda a crescer

Já é assinante?

Informação de qualidade que o ajuda a crescer