Opinião

“Novo Aviso” do BNA: transparência reforçada ou restrição acrescida?

Milena Politano

Especialista em Compliance e Regulação Financeira

22 Maio, 2025 - 09:13

22 Maio, 2025 - 09:13

Milena Politano

Especialista em Compliance e Regulação Financeira

O Banco Nacional de Angola (BNA) publicou, recentemente, o Aviso n.º 01/2025, de 30 de Abril, que revoga integralmente o Aviso n.º 06/2020, de 10 de Março. Esta medida surge no quadro do reforço da arquitectura regulatória aplicável ao sector bancário, especificamente no tocante à concessão de crédito a partes relacionadas, num esforço notório de mitigação de riscos de conflito de interesse e promoção de uma cultura de ética, integridade e responsabilização institucional.

Trata-se de um normativo que não apenas densifica os requisitos de conformidade, mas sinaliza uma viragem cultural e estrutural na relação entre os bancos e os seus stakeholders internos, em alinhamento com os princípios internacionais de supervisão prudencial e de governação corporativa responsável.

Principais inovações introduzidas

O novo aviso destaca-se por introduzir um conjunto de exigências mais estritas, entre as quais se destacam:

  1. Alargamento do âmbito de aplicação – Passa a abranger todas as partes relacionadas, incluindo membros dos órgãos sociais, comités internos e titulares de funções relevantes, e não apenas os detentores de participações qualificadas.
  2. Redução dos limites de exposição – Estabelece limites máximos de concessão de crédito a partes relacionadas: 1% dos Fundos Próprios no caso de pessoas singulares, e 5% para pessoas colectivas pertencentes ao mesmo grupo económico.
  3. Reforço da auditoria interna – Torna obrigatória a realização de auditorias internas anuais sobre as transacções com partes relacionadas, cujos relatórios devem permanecer à disposição do BNA.
  4. Exclusão de participação em decisões – Determina a proibição de participação em processos de decisão de crédito por parte de membros com interesse directo ou indirecto nas operações em causa.
  5. Implementação de procedimentos internos e reporte periódico – Exige a definição de mecanismos internos específicos de controlo, bem como o envio de reportes trimestrais obrigatórios ao regulador.

Mais do que conformidade: uma mudança de paradigma

A aprovação deste normativo constitui mais do que um exercício de actualização técnica. Implica, sobretudo, uma transformação de cultura institucional. O reforço dos deveres fiduciários, da segregação de funções e da rastreabilidade dos processos de decisão visa garantir não apenas a legalidade formal das operações, mas a legitimidade ética das práticas de crédito no seio do sistema bancário.

“O que era uma zona cinzenta transforma-se, agora, num território de contornos normativamente delimitados.”

O reforço da transparência torna-se, assim, uma exigência sistémica. Já não se trata apenas de cumprir a norma, mas de incorporar, na estrutura de governança, princípios de equidade, isenção e imparcialidade.

A implementação efectiva deste Aviso exigirá, por parte das instituições financeiras, uma profunda reavaliação dos seus processos internos, o que implicará um enorme desafio entre a componente técnica e a ética. Quatro pontos a destacar:

  • Reconfigurar a cartografia de partes relacionadas;
  • Rever os modelos de risco e limites de exposição;
  • Adequar os fluxos de decisão;
  • Estabelecer sinergias mais robustas entre as áreas de risco, compliance, auditoria e administração.

A coordenação transversal entre estas áreas tornar-se-á um imperativo operativo para assegurar a conformidade e, simultaneamente, preservar a confiança dos investidores, clientes e supervisores.

O Aviso n.º 01/2025 assinala um novo momento de maturidade regulatória no sector bancário angolano. O crédito a partes relacionadas, outrora terreno de ambiguidade normativa e laxismo ético, passa a ser regulado com rigor e clareza. Esta directiva não deve ser entendida apenas como um instrumento de limitação, mas como alavanca para uma maior integridade, transparência e estabilidade sistémica.

Com esta acção, o Banco Nacional de Angola reitera a sua intenção de fortalecer a confiança no sistema financeiro e de elevar os padrões de governança no sector bancário. O futuro da banca em Angola dependerá, cada vez mais, da capacidade das instituições em internalizar estes princípios como parte indissociável do seu modelo de actuação.

É tempo de actuar com transparência, responsabilidade e rigor – sem excepções.

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