Opinião

O crime de abuso de informação privilegiada no mercado de capitais

Salomão Abílio

Jurista

7 Agosto, 2025 - 11:24

7 Agosto, 2025 - 11:24

Salomão Abílio

Jurista

O mercado de capitais em Angola dispõe de mecanismos destinados a garantir a confiança e a protecção dos investidores. Justamente por isso, o Código dos Valores Mobiliários insta os emitentes de valores mobiliários ou de outros instrumentos financeiros que sejam objecto de negociação em sede de mercado regulamentado que comuniquem à Comissão do Mercado de Capitais (CMC) informações de carácter financeiro ou corporativo ligadas ao próprio emitente ou aos seus instrumentos financeiros que qualquer disposição legal ou regulamentar os obrigue tornar públicas em Angola ou que considerem necessário, o seu interesse, divulgar aos investidores.

Nesta senda, o art.  387.º do Código de Valores Mobiliários vem punir com a pena de prisão de até cinco anos ou com pena de multa até 300 dias o crime de abuso de informação privilegiada (ou insider trading, terminologia anglo-saxónica).

O abuso de informação privilegiada ocorre, entre outras, nas seguintes situações:

Quando alguém, devido à sua posição num órgão de administração ou fiscalização de um emitente, obtém informação privilegiada.

Quando alguém, como detentor de participação social no capital de uma sociedade comercial, obtém informação privilegiada.

Quando alguém, devido ao trabalho ou serviço prestado a um emitente ou outra entidade, ou em razão da profissão ou função pública, obtém informação privilegiada.

O insider trading também pode ocorrer se a informação for obtida de forma ilícita ou se houver suspeita de prática de um acto ilícito, sendo concretizado quando essa informação é transmitida a terceiros fora do âmbito normal das suas funções, ou quando, com base nessa informação, a pessoa negocia ou aconselha alguém a negociar valores mobiliários ou instrumentos derivados, ou ordena a sua subscrição, aquisição, venda ou troca, directa ou indirectamente, para si ou para outrem.

A punição do crime de abuso de informação privilegiada vertida no Código dos Valores Mobiliários visa tutelar alguns pressupostos de funcionamento de um sector da economia nacional, o mercado de valores mobiliários, que tem relevância constitucional à luz dos arts. 89.º e 92.º da Constituição.

Concretamente, visa-se «proteger a função pública da informação enquanto justo critério de distribuição do risco do negócio no mercado de valores mobiliários. Trata-se de um bem jurídico económico que é pressuposto essencial da organização e funcionamento dos mercados de valores mobiliários. Está em causa a igualdade perante um bem económico (a informação) necessário para a tomada de decisões económicas racionais. Quem usa negocialmente informação privilegiada subverte as condições de regular funcionamento do mercado e coloca em perigo os seus níveis de eficiência.»

O nosso Código dos Valores Mobiliários – que está em processo de revisão – prevê igualmente outras sanções que constam nos artigos 427.º (transgressões relativas à informação), 428.º (transgressões relativas aos emitentes), 429.º (transgressões relativas aos valores mobiliários ), 430.º (transgressões relativas à oferta), 433.º (transgressões relativas à contraparte central e sistemas de liquidação), 434.º (transgressões relativas às actividades e serviços de intermediação), 436.º (transgressões relativas às ordens do Organismo de Supervisão do Mercado de Valores Mobiliários), 437.º  (autoridades competentes em processo criminal).

Em síntese, o mercado de capitais angolano, ao longo dos seus vinte anos de existência, tem vindo a ser estruturado com vista a garantir a confiança dos investidores, a liquidez dos títulos e a promoção da igualdade de informação entre todos os participantes. Esses mecanismos asseguram uma concorrência justa e protegem o princípio da livre concorrência [art. 89.º, n.º 1, al. c), da Constituição], essencial para o funcionamento eficiente e transparente do mercado.

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