Opinião

OGE 2025: Da teoria à prática

Fânia Massua

Economista

17 Setembro, 2025 - 15:07

17 Setembro, 2025 - 15:07

Fânia Massua

Economista

‎Por mais promissoras que sejam as metas estabelecidas pelo Governo no Orçamento Geral do Estado (OGE) para 2025, os primeiros seis meses do ano demonstram que a realidade económica do país está a testar severamente a viabilidade dessas intenções.

‎No seu Relatório de Fundamentação, o Governo centrou as suas prioridades em quatro eixos: aumento do rendimento, segurança alimentar, investimento social e robustez das finanças públicas (sic), o que, do meu ponto de vista, se trata de um desenho ambicioso. No entanto, passados os primeiros 180 dias do ano, vejamos o fosso entre o planeado e o concretizado, tendo em conta os indicadores macroeconómicos actuais.

‎No âmbito da execução orçamental para 2025, o OGE previu uma estimativa global de receitas e autorizou despesas no valor total de AOA 34,63 biliões (US$ 37,97 mil milhões). No primeiro semestre do ano, o Estado arrecadou receitas no montante de AOA 5,93 biliões (US$ 6,50 mil milhões), o que corresponde a 17% do total da receita anual estimada no exercício económico vigente. Quanto à despesa, foram realizados gastos no valor de AOA 6,44 biliões (US$ 7,06 mil milhões) durante o mesmo período, o que equivale a apenas 19% do total anual autorizado. Esses dados indicam que os níveis de execução semestral em relação ao total anual permanecem significativamente baixos, tanto do lado da receita quanto da despesa.

‎Tendo em conta a prioridade de aumento do rendimento que consiste principalmente no ajuste salarial da função pública com vista a recuperação do poder de compra das famílias, espelhada no Relatório de Fundamentação, o Executivo mantém o compromisso de cumprir com o acordo social estabelecido e a sua política de continuar a valorizar os rendimentos e mitigar o impacto da inflação sobre o poder de compra. Para tal, espera-se que, para este ano, a inflação seja mais baixa, relativamente à taxa de inflação acumulada de 23,4% que se perspectivava até finais de 2024, facto que, até ao momento, não se verifica.

‎A inflação, que deveria atingir a meta de 16,6%, mantém-se em níveis bastante elevados, ou seja, passados seis meses a taxa de inflação encontra-se em 3,1 pontos percentuais acima do previsto. Apesar de uma trajectória de queda que começou em Janeiro (com 26,5%) e culminou em Junho com 19,7%, a média semestral situou-se em 23,07%, valor que não só ultrapassa a meta estabelecida como evidencia a dificuldade do Governo em conter a espiral inflacionária, que continua a corroer o poder de compra dos angolanos.

‎A economia continua a mostrar sinais de desaceleração, não obstante o Banco Nacional de Angola (BNA) ter mantido, pela sétima vez consecutiva, a taxa básica de juro em 19,5%. Uma decisão tomada durante a quarta reunião do Comité de Política Monetária (CPM) em 2025, num contexto de forte pressão no mercado cambial.

‎O dólar e o euro continuam acima dos AOA 900 (US$ 1), com a moeda norte-americana fixada em AOA 911,955 por cada dólar. A inflação elevada no país tem sido, em grande parte, impulsionada pela desvalorização cambial, uma vez que Angola depende fortemente da importação de bens essenciais.

‎No primeiro semestre do ano, a taxa de câmbio oscilou entre AOA 911 e AOA 912 por cada dólar, o que terá encarecido as importações e pressionado os preços internos.

‎Outro factor que merece atenção é o sector petrolífero, base fundamental da economia nacional. O OGE 2025 foi estruturado com a expectativa de uma produção diária de 1.098 mil barris e um preço médio de USD 70 por barril. No entanto, os dados do primeiro semestre apontam para uma produção média de apenas 1.001,7 mil barris/dia e um preço médio ligeiramente abaixo do previsto (USD 69,89).‎

‎A combinação de menor produção com preços abaixo do esperado compromete seriamente a capacidade do Estado em arrecadar receitas, impactando directamente a execução orçamental e a sustentabilidade fiscal.

‎Se, por um lado, é justo reconhecer o esforço do Governo em tentar reverter a trajectória inflacionária, por outro, é evidente que os mecanismos de política económica ainda não estão a produzir os efeitos desejados. O cenário actual exige mais do que projecções optimistas; exige correcções estruturais, maior eficácia na execução das políticas públicas e, sobretudo, uma resposta coordenada entre política fiscal e monetária.

‎A robustez das finanças públicas, uma das prioridades do OGE, não será alcançada sem que se enfrentem, de forma decisiva, os factores internos que contribuem para a instabilidade económica. A produção nacional deve ser incentivada para reduzir a dependência de importações, e as políticas sociais precisam de ser mais eficazes na protecção das camadas mais vulneráveis.

‎Em suma, os desafios do OGE 2025 são reais e exigem uma abordagem pragmática. É necessário que o Executivo assuma, com clareza e responsabilidade, que metas ambiciosas não bastam por si só. A execução prática, sustentada em dados reais e não em projecções idealizadas, será o verdadeiro teste da capacidade do país em enfrentar os obstáculos económicos com resiliência e visão de futuro.

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