Em Foco

Editorial. Como vê, senhor Presidente, o mundo não acabou!

30-01-2023 10:24

Nelson Francisco Sul

Director

30-01-2023 10:24

Nelson Francisco Sul

Director

Dois eventos ocorridos na capital Luanda marcaram o último final de semana. A marcha convocada pelo grupo político de Abel Chivukuvuku, que pretendia exigir uma definição clara sobre as eleições autárquicas, e a manifestação dos activistas que pretendiam exigir a libertação daqueles que consideram ser presos políticos, com destaque para Gilson Moreira, mais conhecido por "Tanaece Neutro", e Luther Campos. Além de terem sido violentamente reprimidas pela Polícia Nacional, ambas as manifestações tiveram outro facto em comum: não autorização por parte do governador Manuel Homem, apesar de cumpridas todas as exigências legais

Os deputados do principal partido na oposição, a UNITA, que se juntaram à manifestação convocada pelo grupo político denominado PRAJA-SERVIR ANGOLA, cuja legalização, entretanto, fora rejeitada pelo Tribunal Constitucional, também não foram poupados. Há, inclusive, imagens do deputado Américo Chivukuvuku, irmão mais novo de Chivukuvuku, estatelado no chão e algemado com as mãos atrás das costas por polícias destacados no terreno.

Não sendo novidade para ninguém que Angola faz parte da lista dos países menos democráticos do mundo, onde o Governo controla rigidamente a liberdade de expressão, os media e os direitos cívicos e políticos contrários àquele que professa o partido governante, o MPLA, gostaríamos de destacar um facto inédito.

Pela primeira vez, desde a implantação da democracia multipartidária em 1992, os agentes da Polícia Nacional e à paisana (que se presume pertencerem aos serviços secretos) não se incomodaram com a presença dos jornalistas. Dito de outro modo, não colocaram bloqueio ao exercício da liberdade de imprensa. Nenhum jornalista foi admoestado ao captar imagens e ou entrevistar os detidos. Mesmo quando estes estavam a ser levados e seguidamente colocados na patrulha, os jornalistas continuaram a captar imagens, a registar as declarações dos detidos, assim como fotografando e filmando quer os detidos quer os polícias. Algo inédito na antiga colónia portuguesa. Até parecia estarmos diante de polícias noruegueses…

Como podemos ver, senhor Presidente, é possível governar sem restringir a liberdade de imprensa. É possível governar sem reprimir os direitos dos seus opositores, como, por exemplo, Abel Chivukuvuku. Em ultima ratio, como diria José Ivo Satart, não é possível “imaginar que alguém queira governar ou representar a população sem ouvir o que ela tem a dizer”.

Portanto, senhor Presidente, como vê, depois de sábado, o Governo continua o mesmo; Vossas Excelências continuam em funções na Cidade Alta; os deputados continuam em funções; as instituições do Estado continuam a funcionar normalmente. O MPLA continua a ser o partido no poder. Os jornalistas cobriram as duas manifestações, sem qualquer intimidação ou admoestação, e o mundo não acabou!…

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