Opinião

O Poder por trás das Big Four

Rogério Ngombo

Especilaista em Finanças e Controladoria

9 Junho, 2025 - 11:12

9 Junho, 2025 - 11:12

Rogério Ngombo

Especilaista em Finanças e Controladoria

O poder concentrado nas mãos das quatro maiores empresas globais de auditoria e consultoria — Deloitte, PwC, EY e KPMG, as chamadas Big Four — representa uma realidade complexa e, muitas vezes, pouco discutida à altura de sua influência. Em 2024, essas corporações alcançaram uma receita combinada de aproximadamente US$ 212 bilhões, reafirmando seu domínio não apenas sobre o mercado de serviços financeiros, mas também sobre a própria arquitectura da confiança que sustenta o sistema económico global. Sua actuação transcende a auditoria: elas moldam normas contábeis, influenciam políticas regulatórias, definem padrões de governança corporativa e, por extensão, orientam decisões que afectam corporações e investidores em escala mundial. Essa concentração de poder levanta questionamentos essenciais sobre independência, conflitos de interesse e o delicado equilíbrio de forças no mercado financeiro contemporâneo.

Do ponto de vista técnico, as Big Four detêm uma expertise incomparável, o que lhes confere capacidade de inovar e aprimorar práticas financeiras. No entanto, essa mesma posição privilegiada tem sido associada a episódios de graves falhas, escândalos e crises corporativas, nos quais sua participação enquanto auditoras foi objecto de críticas severas. Em 2024, essas gigantes do sector enfrentaram multas combinadas que ultrapassaram a marca dos US$ 95 milhões, impostas por autoridades em várias jurisdições. Aqui, o campo da ética aplicada às finanças torna-se imprescindível: como garantir que essas gigantes comerciais, que vendem múltiplos serviços, possam preservar a integridade e a transparência essenciais à sua função? O modelo de negócios dessas empresas, que combina auditoria, consultoria e outros serviços, expõe um claro potencial para conflitos de interesse, colocando em xeque sua independência e comprometendo a confiança do mercado.

Entretanto, essa discussão vai além das questões técnicas. Ela toca um ponto mais profundo, quase filosófico: o exercício do poder. Um poder que, ao mesmo tempo em que sustenta a estabilidade dos mercados e favorece o desenvolvimento económico, também carrega um risco implícito. O facto de poucas empresas concentrarem tamanha influência sobre decisões globais levanta um alerta. Por mais que seu papel seja relevante e necessário, é justamente essa posição dominante que exige atenção constante, mecanismos de equilíbrio e uma vigilância regulatória eficaz. Caso contrário, o que deveria ser uma força para o bem pode acabar distorcendo o próprio sistema que pretende organizar.

Mas a verdade é que esse poder está intrinsecamente ligado a algo quase invisível — e imensamente valioso: o valor intangível que essas instituições carregam consigo, o peso da marca. E talvez seja justamente aí que resida sua grandeza: na capacidade de transformar reputação em influência, e influência em estabilidade.

Reconhecer isso não é temer o poder — é compreendê-lo. Porque, no fim das contas, o mundo não é movido apenas por números, mas por narrativas.

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